terça-feira, 22 de outubro de 2013

"Vazio de Nós" confirma força narrativa de Berna Reale



 
Soledade_performance de Berna Reale_http://bangalocult.blogspot.com
Berna realiza performances contundentes como "Soledade"

Americano_performance de Berna Reale_http://bangalocult.blogspot.com
Levando a tocha olímpica em "Americano"


Imagine uma mulher bem vestida, penteada impecavelmente, conduzindo uma biga dourada (carro de duas rodas movido por cavalos na época da antiguidade) puxada por quatro porcos, em meio às ruelas da periferia de uma cidade. Cena surreal, não ? Ou essa mesma mulher, dessa vez com um figurino de policial da tropa de choque, usando uma focinheira, montada num cavalo pintado de vermelho, desfilando pelo centro de Belém ?
Pois bem, essas duas cenas inusitadas e desconcertantes fazem parte, respectivamente, das performances “Soledade” (2013) e “Palomo” (2012) da artista paraense Berna Reale e podem ser conferidas até o dia 8 de dezembro, no Museu de Arte do Rio (MAR), dentro da individual “Vazio de Nós”.
Composta por cinco performances para vídeo- completam a exposição, “Ordinário” (2013), “Sem/Título” (2011) e “Americano” (2013)- e sob a curadoria de Daniela Labra, “Vazio de Nós” reflete sobre o mundo e a vulnerabilidade humana, discutindo crimes de toda ordem, condições de pobreza e violência social contra indivíduos de zonas marginalizadas.
No vídeo mais impressionante da individual montada, no piso inferior do Pavilhão de Exposições do MAR, Berna Reale é transportada por dois homens, pelas ruas de Belém, atada a uma vara de metal e completamente nua. “Sem/Título” faz uma analogia com o processo do abate de animais, não deixando de discutir também, a banalização da morte. Em “Soledade”, filmada em uma rua homônima que integra a rota de tráfico de drogas, a performer aborda o negligência do poder público para com os mais necessitados.
Já em “Ordinário”, realizado no bairro Jurunas, um dos mais populosos da capital paraense e berço da cantora Gaby Amarantos, Berna recolhe ossadas reais encontradas pela polícia em cemitérios clandestinos na área metropolitana da sua cidade e perambula pelas ruas, empurrando um carrinho com esses esqueletos. A performance é uma denúncia às ações de extermínio.
Apesar de realizado no ano passado, “Palomo” é bastante atual. Em tempos de manifestações de ruas bastante aguerridas, esta performance aborda poeticamente o abuso do poder institucional. Por fim, “Americano” foi realizada especialmente para esta exposição no Rio de Janeiro, que sediará as Olimpíadas de 2016.
Feita no Complexo Penitenciário de Americano, em Santa Izabel, nesta performance a artista percorre os corredores da penitenciária levando uma tocha, símbolo antigo da purificação e conhecimento e hoje, ícone olímpico. “Questiono a tocha olímpica como símbolo de triunfo. Que luz é essa que está alimentando coisas e ao mesmo tempo, escondendo coisas?  O vídeo ‘Americano’ fala da problemática de quando o país passa a ser uma vitrine, por conta dos jogos olímpicos, por exemplo,  e as mazelas são camufladas, escondidas”.
Chama a atenção, no vídeo, a reação dos presos desavisados, que esboçam total surpresa diante da cena protagonizada por Berna. Inclusive, ela pretende voltar ao complexo para saber dos presos o que eles acharam do seu trabalho. Um trabalho, aliás, bastante elaborado e que passa ao largo da obviedade.
Formada em Artes pela Universidade Federal do Pará e perita criminal, Berna Reale é uma performer brasileira, que começou a chamar a atenção da crítica de arte, quando realizou a performance “Quando Todos Calam” (2009).  Tem como principal objeto de pesquisa a violência na contemporaneidade. Não só a violência estampada nos jornais, mas também a silenciosa e, sobretudo, como a coletividade lida com essa questão. Para a artista, a violência não pode se tornar íntima do indivíduo.
Explorando a semiótica como base de elaboração de suas performances, Berna se preocupa com o entendimento do público para com a sua arte, utilizando símbolos e signos que sejam facilmente decodificados. “Para mim, não interessa trabalhos muito intelectualizados, trabalhos que mexam com coisas que as pessoas não se identifiquem, porque meu objetivo é alcançar o espectador. Se ele não se sente, questionado, atraído ou  incomodado pela minha performance, não cheguei no meu objetivo”.
No currículo de Berna, consta a participação na Bienal de Cerveira, (Portugal, 2005) e na Bienal de Fotografia de Liege (Bélgica, 2006), além da exposição “Amazônia – Ciclos da Modernidade”, no Centro Cultural Banco do Brasil (Rio de Janeiro, 2012). 

Recebeu o Grande Prêmio do Salão Arte Pará, em Belém (PA, 2009) e foi selecionada para o Rumos Visuais – Itaú Cultural (2012-2013). Vencedora da categoria on line do PIPA- Prêmio Investidor Profissional de Artes (2012), aguarda ansiosa o resultado do PIPA 2013, cujo resultado sai no próximo mês.

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