sexta-feira, 12 de julho de 2013

Première de "Aos Ventos que Virão"

Hermano Penna, Luís Miranda, Antônio Leite e Rui Ricardo
Rui Ricardo e Luís Miranda com a figurinista Celinha Cariri
Rosângela Rocha (diretora do NPDOV) e Orlando Vieira
Hermano e parte da equipe de "Aos Ventos que Virão"


Na noite da última quarta-feira, o Cine Vitória foi inaugurado, oficialmente, com a pré-estreia do filme "Aos Ventos que Virão" de Hermano Penna. O cinema já estava funcionando desde maio, quando aportou pela primeira vez em Aracaju, o Festival Varilux de Cinema Francês. Logo depois, o cine deu uma parada nas atividades, e há três semanas, voltou com "a corda toda", com uma programação diversificada, de deixar os cinéfilos radiantes.

Talvez por conta de agenda do diretor e dos atores, só agora foi possível, a película rodada, praticamente em sua totalidade, na cidade de Poço Redondo, distante 184 km de Aracaju, ser vista por aqui. Afinal, pré-estreia sem estrelas, não tem graça. Além do diretor, marcaram presença na première os atores Rui Ricardo Diaz, Luís Miranda, Orlando Vieira, Antônio Leite, Vieira Neto, entre outros membros da equipe técnica. A atriz Emanuelle Araújo que havia confirmada a presença, não pode vir por conta de gravações.

A primeira sessão oficial de "Aos Ventos que Virão" aconteceu no Cine PE deste ano. Segundo o próprio Hermano Penna, o público pernambucano recebeu bem o filme, porém a crítica especializada não foi tão enfática, positivamente. No filme, a pequena cidade do interior de Sergipe - Poço Redondo - entra inadvertidamente para a história como o palco da morte de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião. Junto com ele, morrem também o Cangaço e toda uma era da História do Brasil. E inicia-se a perseguição dos cangaceiros remanescentes, agora sem líder, nem direção.

Zé Olímpio (Rui Ricardo Diaz) é um destes cangaceiros. Ele sabe que não terá um minuto de paz enquanto o Sargento Isidoro (Edlo Mendes) estiver em seu encalço. Para ele, a única saída é abandonar a fazenda de sua família e tentar vida nova em São Paulo, ao lado da esposa Lúcia (Emanuelle Araújo). Agora, Zé Olímpio começa outras lutas. Contra o preconceito, o subemprego e a intolerância. E sentindo-se um estranho no ninho na metrópole paulistana, além de ter que resolver questões de herança, após a morte do pai, Zé Olímpio decide retornar à sua terra, tendo sempre como braço direito, o vaqueiro Nêgo de Rosa (Luís Miranda).

Não demorará para ter eleições na cidade e a candidatura de Zé Olímpio ser lançada para ocupar a prefeitura. No entanto, devido a um acordo firmado entre o partido do candidato concorrente (o filho do Coronel Coriolano) e a justiça eleitoral,  os possíveis eleitores de Zé Olímpio ficam impossibilitados de votar, por conta do não recebimento  de seus títulos e  ele se vê obrigado a "fazer justiça" com as próprias mãos. Preso, juntamente com outros companheiros que o ajudaram a queimar as urnas, Zé Olímpio acompanha a construção de Brasília pelas revistas e vê a  mudança da capital para o  centro do país, como o  despontar de uma nova esperança.

Crítica- Ainda que sem data definida para o lançamento comercial, o filme não deixa de dialogar com o momento atual. "Aos Ventos que Virão" chega por aqui, em meio às manifestações populares espalhadas pelo país. A insatisfação contemporânea com a política é semelhante a que acompanha o personagem Zé Olímpio por quase toda a projeção. O personagem, aliás, é fictício, mas inspirado em Zé de Julião, o cangaceiro Cajazeira, filho do maior fazendeiro da região de Poço Redondo. O longa, no entanto, não é sobre o Cangaço, nem sobre cangaceiros (apesar deles aparecerem em três sequências do filme, inclusive, Lampião).

Penna conheceu a história de Zé Julião, através do historiador sergipano Alcino Alves, em 1976, quando filmou em Poço Redondo, o documentário "A Mulher no Cangaço". Inicialmente,  a história do personagem de Zé Olímpio era mais próxima da realidade vivida por Zé Julião, mas com os inúmeros tratamentos do roteiro, "Aos Ventos que Virão" tornou-se um mosaico de lembranças pessoais e de muitas histórias escutadas em andanças e vivências do diretor.

Aliás, essas mexidas no roteiro (escrito pelo diretor, conjuntamente com Paulo Sacramento e Jaqueline Tavares) não fizeram bem ao produto final. Existem algumas lacunas incômodas, como por exemplo, a saída de cena -por um bom período- de Lúcia que deixa o espectador um tanto desnorteado. Num primeiro momento, ela está grávida e despede-se de Zé Olímpio, em São Paulo, antes dele retornar a Poço Redondo. Passa-se um bom tempo para Lúcia reaparecer, já quando Zé está preso, e aí, ela faz menção aos filhos ( são dois, mas não se sabe com que idade estão ?), entregando ao marido um presente que eles mandaram. Nesse meio tempo, Zé Olímpio articulou-se politicamente, candidatou-se à prefeitura, fugiu com as urnas, ateou fogo nelas e foi preso. Mas não se tem a menor noção onde está Lúcia.  

Esses saltos no tempo, inclusive, não são bem acompanhados pela equipe de maquiagem. Zé Olímpio pouco envelhece na tela e Nêgo de Rosa e Lúcia mostram que duas décadas para eles, funcionam como dois meses. O figurino assinado pela experiente Celinha Cariri funciona bem em quase todas as instâncias, sobretudo nos modelitos confeccionados para a personagem de Emanuelle Araújo. No entanto, "algo fica fora de ordem" quando o bando de cangaceiros entra em cena. O figurino deles está "asséptico" demais e um tanto quanto "carnavalesco". 

Mas se o filme derrapa em alguns aspectos técnicos- talvez por questões de orçamento apertado- em três setores, ele não decepciona: direção de atores, fotografia e trilha sonora. Ao conversar com os atores sergipanos Orlando Vieira (Zé de Antão) e Antônio Leite (Coronel Coriolano)- ambos trabalharam junto com o diretor em "Sargento Getúlio"- eles afirmam num uníssono, que Hermano sabe lidar muito bem com o elenco e, enaltece o trabalho de atores secundários à trama.

"Quando Hermano vem filmar no Nordeste, sabemos que não somente os protagonistas terão destaque, mas também o povo do sertão. Daí porque, os coadjuvantes têm força na trama. Fiquei extremamente agradecido com o convite, por ter podido colaborar com ele em mais um projeto", conta Orlando Vieira.

"O cinema de Hermano Penna é um cinema apurado, de qualidade, com uma luz bonita... E ele tem um talento nato para lidar com atores. Esse é o quarto filme que faço com ele, depois de 'Sargento Getúlio' e, para mim,  a experiência é sempre salutar", diz Antônio Leite.

A fotografia de André Lavenère tem momentos expressivos, como a noturna, em que Nêgo de Rosa se encontra com Zé de Antão, ao redor de uma fogueira; o cortejo nupcial e o resgate de Zé Olímpio pelas mulheres peregrinas.

A trilha sonora assinada pela dupla José Luiz Penna e Tiago Araripe também não passa desapercebida. É uma mistura bem dosada de temas regionais e folclóricos, que curiosamente, foge ao clichê (a banda de pífanos conduzindo o cortejo nupcial e o trio animando a festa de casamento são ótimos).

Talvez o grande problema de "Aos Ventos que Virão" tenha sido a falta de maiores recursos para a produção.  Como disse, o próprio Hermano, em entrevista a ser publicada mais tarde no blog, "o que atrapalhou mais, foram os meios que não eram tão grandes quanto à pretensão do diretor". Ainda assim, o filme de Hermano, comparando-se aos outros longas que foram realizados em terras sergipanas, nos últimos seis  anos e já deram "a cara prá bater", com certeza será o que mais orgulho proporcionará aos conterrâneos.

Afinal, o sergipano agradece, por finalmente, se reconhecer na telona.


Crédito das fotos: Marco Vieira




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