quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

"Casa-Grande e Senzala" Urbana


Cena de O Som ao Redor_http://bangalocult.blogspot.com
Bia (Maeve Jinkigns) em raro momento de sossego com os filhos

Muitos dizem que crítico de cinema é um cineasta frustrado. Se isso é verdade (e eu discordo), Kléber Mendonça Filho passa ao largo da classificação. O jornalista e crítico pernambucano, que trabalhou mais de uma década para o Jornal do Comércio e notabilizou-se pelo blog Cinemascópio, há 15 anos iniciou sua carreira de cineasta, contabilizando no currículo, até o momento, sete curtas- entre os quais, os premiados “Vinil Verde” (2004), “Eletrodoméstica” (2005), “Recife Frio” (2009)- e dois longas- o documentário “Crítico” (2008) e “O Som ao Redor” (2012).

Se até “Crítico” suas produções só eram conhecidas, praticamente, por conta dos festivais de cinema, a partir de “O Som ao Redor”, a dinâmica de circulação configurou-se bem diferente. O filme, que durante o ano passado, percorreu cerca de 35 festivais, vencendo prêmios importantes, como o de Melhor Filme escolhido pela FIPRESCI, no Festival de Roterdã; Melhor Diretor, Prêmio de Crítica, Prêmio do Júri Popular e Melhor Som, no Festival de Cinema de Gramado; Melhor Filme e Melhor Roteiro no Festival do Rio e Melhor Filme (Prêmio Itamaraty) na 36ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, estreou há três semanas no circuito nacional e, agora, chega às telas dos cinemas sergipanos, reconhecido como o Melhor Filme Latino-americano pelo júri da 3ª edição do Prêmio Cinema Tropical, entregue na sede do jornal The New York Times.

Há muito tempo não assistia a um filme brasileiro tão inteligente e mordaz, com um roteiro tão bem elaborado, à altura das ótimas produções argentinas, e que ainda consegue conquistar o público e a crítica, simultaneamente. Seu sucesso, em parte, deve-se à elaborada experiência sensorial que o espectador tem ao longo da projeção.

O filme é uma homenagem ao cinema dos primórdios, o não falado. A palavra, em si, pouco importa (muitos diálogos são banais, descartáveis, beiram o ridículo), o que vale mais em “O Som ao Redor” é a conexão da imagem e do som, o caleidoscópio audiovisual que Kléber constrói, a partir do cotidiano de alguns moradores de um bairro recifense de classe média ( o diretor ambientou a trama no seu habitat, a rua Setúbal).

Nas primeiras cenas, em que a câmera acompanha o momento de lazer de duas crianças, na garagem de um prédio, tem-se a impressão que a tranquilidade impera no bairro, aparentemente, calmo. No entanto, a batida grave que marcará todo o filme, criando uma tensão constante, é o sinal de que uma batalha invisível é travada diariamente naquele campo urbano.

Mas qual das partes sairá vitoriosa- nesse filme que tem como esteio, a vingança: a dos patrões, personificada pela figura do outrora senhor de engenho e, hoje, especulador imobiliário, Francisco (W.J. Solha) ou a dos empregados, bem representada pelo segurança Clodoaldo (Irandhir Santos) ?

Em “O Som ao Redor”, onde a luta de classes e o abismo social só fez migrar da zona rural para a urbana, os destaques ficam por conta da direção equilibrada de Kléber Mendonça, imprimindo, por vezes, um tom naturalista à narrativa que aproxima o espectador à obra; das interpretações de Irandhir Santos (sempre competente) e de Maeve Jinkings, como a impagável Bia, a dona de casa enlouquecida com o cachorro barulhenta; da elaboração e finalização do som, um trabalho conjunto do sergipano DJ Dolores, com a editora de som, Catarina Apolônio, o engenheiro de som Gera Vieira e seu assistente de mixagem Carlos Montenegro, o sound designer Pablo Lamar, além da fotografia assinada por Pedro Sotero.


Corra para assistir às duas sessões diárias (18h45 e 21h40) de “O Som ao Redor” no Cinemark Jardins. Antes que seja tarde!!!

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